O que vou explorar?
“Na sua juventude, Norbert Elias (1897-1990), notável sociólogo conhecido sobretudo pelo estudo dos “processos civilizacionais”, foi assistir, em Cambridge, à conferência de um médico de nomeada. Viu então entrar um senhor muito idoso que arrastava os pés. A sua juventude saudável surpreendeu-se e como que se irritou: “Porque é que aquele homem não conseguia andar como as outras pessoas «normais»?”. A surpresa deu rapidamente lugar à indiferença: o senhor arrastava os pés porque era demasiado idoso.”
Laura Ferreira dos Santos, 2014. https://www.publico.pt/2014/06/08/sociedade/opiniao/porque-e-que-ele-arrasta-os-pes-1639131
Nota: Laura Ferreira dos Santos (1959-2016), doutorada em Filosofia da Educação, foi professora associada na Universidade do Minho, pioneira da defesa da despenalização da eutanásia e fundadora do Movimento Direito a Morrer com Dignidade
O que me proponho abordar no domínio da Gerontologia, a razão de ser deste website e deste blogue associado, tem sobretudo a ver com o querer informar sobre o processo de envelhecimento e o que lhe está associado, o que podemos fazer para o alentecer e o que podemos todos, como coletivo intergeracional, fazer para desconstruir a visão idadista socialmente transversal, que muitas vezes começa ainda no local de trabalho, quando algumas pessoas mais velhas acham que os colegas de cabelos brancos ou grisalhos já estão a mais. Curiosamente, conheço quem os tenha desde os 30 anos!
Efetivamente, o idadismo é uma praga social porque é usado para categorizar e dividir as pessoas de maneira a causar prejuízos, desvantagens e injustiças, e para arruinar a solidariedade entre as gerações. Na prática, é institucional (leis, regras, normas sociais, políticas e práticas institucionais), interpessoal (interação entre dois ou mais indivíduos) e pessoal (internalizado pela pessoa contra si própria, quando afirma, por exemplo, “já não tenho idade para vestir isto”; “já não é próprio para a minha idade”).
O idadismo é indissociável da abordagem gerontológica e ainda está mal estudado porque se tem olhado mais para a idade como um «prazo de validade» e menos como um «Direito a SER, Sempre», apesar de atualmente as pessoas mais velhas estarem a ser encaradas como um nicho de mercado apetecível e com potencial de consumo diversificado para produtos dedicados, do lazer à saúde, uma abordagem de mercado também ela idadista.
Há obviamente uma «idade tampão» que começa com o afastamento das pessoas mais velhas do mercado de trabalho, quando a sua experiência, qualificações, utilidade e competências poderiam ser bem aproveitadas, mas também quando pretendem continuar a trabalhar, por prazer ou necessidade, mas uns marcadores etários e variáveis, consoante os países, os afastam do mercado de trabalho.
É incrível que haja em Portugal uma regra que foi publicada há 99 anos (quase um século) e que se mantenha inalterada, como definido no Diário do Governo de 24 de julho de 1926 e que consta da atual Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (Lei n.º 35/2014, Série I de 2014-06-20, artigo 292º-1, com alterações em 2022) que o prazo máximo para um/a funcionário/a público/a exercer funções são os 70 anos de idade! Mas, porquê?
Será que não percebem as alterações que ocorreram na evolução da escolaridade, das condições socioeconómicas, da medicina e da esperança de vida?
No Mónaco a «idade tampão» já foi ajustada para os 74 anos e em Itália para os 75 anos, mudança feita pela Sociedade Italiana de Gerontologia e Geriatria, que considerou que as condições físicas e cognitivas das pessoas de 65 anos hoje são comparáveis às de alguém com 40 ou 45 anos há três décadas!
Claro que este meu blogue estará sempre focado na qualidade da informação gerontológica, sem ser «fofinho», como aliás nunca foi a minha abordagem geográfica, a minha primeira ciência.
Acredito que juntos faremos a mudança!