Enquanto processo natural, idiossincrático, universal, dinâmico e progressivo, por isso ativo e organizado no tempo, o envelhecimento tem subjacente diferentes factores intrínsecos (biológicos, bioquímicos, comportamentais, morfológicos, psicológicos) e extrínsecos (geográficos, socioculturais, socioeconómicos) que justificam o seu carácter multifactorial, a polissemia do conceito e as modificações que ocorrem nos sujeitos com o passar dos anos, com destaque para as mudanças na composição bioquímica dos tecidos, diminuição progressiva na capacidade fisiológica, nomeadamente na fisiologia hormonal, redução na capacidade de adaptação aos estímulos, aumento na suscetibilidade e vulnerabilidade às doenças, redução da capacidade funcional, perdas dos papéis sociais, solidão, perdas psicológicas, motoras e afetivas.
Contudo, há um elemento fulcral comum a todo o envelhecimento, é o continnum da vida que começa na concepção e termina na morte!
Todavia, porque os fatores determinantes do envelhecimento produzem efeitos deletérios diferentes de uma pessoa para outra, é igualmente importante chamar à colação fatores extrínsecos como o tipo de dieta e a sedentariedade, intensificadores de efeitos adversos.
Envelhecimento, velhice e velho/a são três conceitos que têm subjacente alterações e desafios, pessoais e também sociais.
O «envelhecimento» é um fenómeno comum a todos os seres vivos animais, um processo dinâmico e progressivo que se segue à fase de maturidade e que se evidencia por diferentes modificações (morfológicas, funcionais, bioquímicas, psicológicas e sociais) com uma distribuição temporal não universal, havendo por isso diferentes realidades para a mesma idade, o que limita a definição de idade biológica, também passível de «modulação» desde que o sujeito se envolva ativamente na manutenção do seu bem-estar.
A «velhice», enquanto última fase do ciclo de vida, de início biologicamente indefinido, está suportada em diferentes aspetos, respetivamente, um «marcador de entrada/ idade tampão», estatístico e social (65 anos em Portugal), manifestações somáticas (calvície, cabelos brancos, redução da capacidade motora e funcional), modificações psicológicas (solidão, tristeza, etc.) e modificações sociais (redução dos papéis sociais, reforma, aumento das perdas). Quando se fala em velhice é igualmente importante relevar diferentes indicadores de bem-estar, alguns passíveis de «manipulação», tais como: saúde biológica, saúde mental, controlo e eficácia cognitiva, competência social, produtividade, atividade, estatuto social, continuidade de papéis sociais e relações informais.
É «velho/a» a pessoa que em qualquer época da vida perde a jovialidade (pode-se ser velho/a sendo novo/a de idade), se isola, deixa de sonhar, perde a esperança, não aprende nem ensina, não põe a sua experiência ao serviço dos outros, olha para o passado e ignora o futuro.
O processo de envelhecimento pode implicar diferentes alterações nos domínios biológico/ orgânico (redução da audição, da visão, da massa óssea, da função pulmonar, da frequência cardíaca, dos parâmetros do perfil hormonal), psicológico (dificuldades com a cognição, aprendizagem de novas tarefas e memória de curto prazo) e social (mudanças de papéis sociais no trabalho, na família e na sociedade; perdas diversas em termos de poder aquisitivo, autonomia, independência, poder de decisão e afectos dos que partem).
Varia em termos individuais e é gradual e progressivo, mais rápido para uns do que para outros. Na sua heterogeneidade sobressaem diferentes alterações, intimamente relacionadas com fatores biológicos, músculo-esqueléticos, psicológicos e sociais.
- Alterações biológicas – têm maior expressão no sistema cardiovascular (redução da frequência cardíaca, aumento do colesterol, aumento da tensão arterial, isquemias do miocárdio, arteriosclerose), no sistema respiratório (diminuição da função pulmonar, maior sensibilidade à menor disponibilidade de oxigénio para o funcionamento de órgãos e tecidos) e no Sistema Nervoso Central (redução no número de neurónios, redução na velocidade de condução nervosa, redução da intensidade dos reflexos, restrição das respostas motoras).
- Alterações músculo-esquelético – afetam a mobilidade e a postura, destacando-se: i) perda de massa muscular (segundo Matsudo, 2000, entre os 25 a 65 anos há diminuição de 10 a 16% na massa muscular magra, massa livre de gordura) e de elasticidade nos tendões e ligamentos (diminui a amplitude de movimentos); ii) perda de massa óssea (osteoporose); iii) alterações da postura corporal (por cifose dorsal, lordose cervical, flexão dos joelhos; diminuição da resistência muscular); iv) menor velocidade na realização de movimentos; v) diminuição da tolerância ao exercício.
- Alterações psicológicas – i) alterações na cognição (maior dificuldade na aprendizagem de novas tarefas e na resolução lógica de problemas, lentificação do raciocínio, dificuldades na orientação topográfica, sobretudo em territórios desconhecidos); ii) alterações de perceção e atenção (aumento do défice de atenção, aumento dos esquecimentos); iii) alterações de memória (dificuldades para recordar nomes, números de telefones, objetos guardados).
- Alterações sociais – têm igualmente um grande impacto e são muito preocupantes porque algumas poderiam ser evitadas/ minimizadas. São influenciadas por diferentes fatores, tais como: i) situação de reforma (diminuição de papéis socias; (re)centramento da vida familiar, reorientação da vida diária com a inclusão de novas atividades, diminuição de rendimentos económicos, maior disponibilidade de tempo livre); perdas relacionais (aumenta a vulnerabilidade pessoal e pode determinar situações de agitação, angústia, depressão, desespero, desorientação, insegurança, etc.); situações de solidão (associada à redução das redes sociais, a problemas de saúde, à falta de rendimento, à ausência de amigos, à perda do cônjuge).
Saber controlar o nosso envelhecimento deveria ser uma competência promovida desde que nascemos, mas efetivamente não é o caso, porque não somos sensibilizados na família numa primeira fase e na escola posteriormente, apesar de todos e todas termos consciência desde cedo de que o envelhecimento é uma realidade, porque vemos sobretudo os anos acentuarem-se nos avós, menos nos pais que consideramos eternamente jovens, apesar dos traços do avanço na idade serem progressivamente evidentes.
De facto, dificilmente se pensa «como se deve envelhecer» quando se é novo, mais preocupados em melhorar o rendimento, a afirmação pessoal, a qualidade de vida da família e cada vez mais também o físico e a aparência saudavelmente musculada, independentemente do género.
Não é fácil ter tudo ao mesmo tempo, mas uma boa gestão do tempo permite que se cuide do corpo, da mente e concomitantemente da saúde em sentido lato, ao longo dos anos, prevenindo atempadamente um envelhecimento que se começa a acentuar a partir dos 30 anos com as progressivas alterações de perfil hormonal (as “nossas hormonas vão baixando cerca de 1-3% ao ano a partir dos 30-35 anos, chegando-se aos 40 anos já com défices manifestados clinicamente e aos 60 e 70 com défices muito marcados, mas passíveis de correção”, segundo a Drª Ivone Mirpuri, Medicina Antienvelhecimento: https://www.draivonemirpuri.pt/medicina-anti-envelhecimento-2/ ), quase ignoradas pela Medicina Geral e Familiar, uma das razões para a fraca sensibilização coletiva existente.
Efetivamente a prevenção é a melhor maneira de atingirmos o envelhecimento saudável, aparentemente relacionado com a forma como nos cuidamos ao longo dos anos, desde que nascemos, apesar de nem sempre os cuidados com a saúde estarem correlacionados com a longevidade, até porque há pessoas que muito se cuidam mas que a biologia e a genética lhes determina um fim de vida precoce e outras que banhadas em exageros parecem ter uma resistência física e intelectual fora do comum. É a vida, afinal!
Na verdade é muito importante sabermos lidar com o processo natural de envelhecimento, se o queremos prevenir, compreendendo e integrando cedo os bons comportamentos para um envelhecimento saudável, sustentado numa nutrição adequada, numa suplementação controlada, no evitar do consumo exagerado de tabaco e de álcool, no uso bem orientado de medicamentos e de vacinas (devidamente concebidas e aprovadas), mas também no exercício físico regular, um determinante fundamental para a boa saúde e o bom envelhecimento (o lema “Pela sua saúde, Mexa-se!” tem sido desde 2013 um foco da Direcção-Geral de Saúde).